Por Rosenildo Ferreira – 12 dezembro de 2023
A cada edição da Conferência das Partes (COP), promovida pela Organização das Nações Unidas (ONU), aumenta o sinal de alerta em relação aos destinos do planeta terra. Afinal, desde o célebre Acordo de Paris, assinado em 2015, o que mais se viu foram retrocessos no campo ambiental. A emergência climática, definida pela necessidade de manter o aquecimento do planeta em 1,5 º C, ainda não foi capaz de seduzir políticos e mega corporações a colocar em prática boa parte das medidas que já deveriam estar gerando dividendos importantes.
Em Dubai, palco da COP28, realizada entre os dias 30 de novembro e 12 de dezembro, os debates giraram em torno da regulamentação do mercado de carbono, previsto desde 1997 pelo Protocolo de Kyoto, e a substituição gradual dos combustíveis fósseis: petróleo, gás natural e carvão, como bases da matriz energética global. Ou seja, a sensação é que nada ou muito pouco evoluiu desde a Rio92, considerada um marco no debate sobre sustentabilidade global.
Ao que parece, nem mesmo a série de alertas emitidos pela Mãe Natureza, por meio da amplificação da intensidade dos fenômenos climáticos que causam devastação de cidades e a perda de vidas, tem sido suficiente para “cair a ficha” dos tomadores de decisão. E as consequências dessa inação podem ser vistas em diversos locais. Inclusive na Amazônia, considerada uma reserva estratégica de biodiversidade e água para o planeta.
Desde setembro, os moradores da Amazônia brasileira contam os prejuízos econômicos e sociais gerados pelos efeitos mais agudos do El Niño, que causa o aquecimento do Oceano Pacífico. Note-se que este fenômeno é recorrente, pois acontece a cada dois anos, afetando o regime de chuvas. Porém, o que se nota na região é que dessa vez os impactos foram potencializados por ações humanas: devastação de florestas para exploração ilegal da madeira e queimadas, para abrir pasto para o gado. A rigor, pode-se dizer que a natureza está dando o troco.
Neluce Soares, coordenadora do Projeto LIRA / Foto: divulgação
Pior para quem depende da floresta para sobreviver, como é o caso de indígenas, ribeirinhos e pequenos produtores rurais que atuam em Sistema Agroflorestal (SAF) de produção. “Somente no Acre, um grupo de agricultores perdeu 40 toneladas de cacau, montante equivalente a um ano de trabalho”, lamenta Neluce Soares, coordenadora do Projeto LIRA – Legado Integrado da Região Amazônica. “Sem chuva, os frutos não se desenvolveram”. Resultado da parceria entre o Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPE), o Fundo Amazônia e a Fundação Gordon e Betty Moore, o LIRA atua no fomento às cadeias produtivas baseadas na sócio-biodiversidade na Amazônia.
Neluce explica que as constantes mudanças no regime de chuvas têm exigido muitas adaptações na vida das pessoas e nos projetos tocados pelo LIRA. Isso porque, até pouco tempo, o trabalho de plantio e colheita era guiado pelo “calendário da floresta”. Com a intensificação dos eventos extremos, como a seca, é preciso desenvolver estratégias para mitigar efeitos de curto prazo, inclusive na saúde dos ribeirinhos. Isso porque, os rios funcionam como as estradas da região. Se os cursos d`água secam, as Unidades Básicas de Saúde (UBS) instaladas em barcas, por exemplo, não têm como chegar em comunidades fora dos grandes centros urbanos: Manaus, Belém, Santarém, entre outras cidades. Foi o que aconteceu com os moradores da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Puranga Conquista, situada na região metropolitana de Manaus e que é considerada um exemplo em matéria de uso sustentável dos ativos ambientais.
Produção de cacau na floresta – Foto: Sidney Oliveira /Ag. Pará – Fotos Públicas
“Nosso objetivo é estimular o uso de Tecnologias Sociais capazes de ajudar as populações tradicionais no processo de transformação da biodiversidade em um grande catalisador do desenvolvimento local”, destaca Neluce. Segundo ela, a seca histórica deste ano colocou os moradores da Amazônia em situação de emergência alimentar. “Sem condições de plantar e colher a própria comida, eles dependem do que vem de fora.”
Enquanto na COP vigora o “faz-de-conta”, as promessas vazias de recursos que nunca são destinados a quem precisa e o poderoso lobby do petróleo, resta à sociedade civil organizada a tarefa de tentar fazer o impossível: salvar o planeta!